Eleonore Koch: Em Cena
Eleonore Koch: em cena apresenta ao público uma reunião de obras da artista de origem judaica, nascida em 1926 na Alemanha, que se refugia no Brasil com a família aos 12 anos de
idade. Eleonore Koch vive períodos em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Londres, falecendo na primeira cidade, em 2018.
Koch abordou gêneros pictóricos tradicionais (paisagens, interiores e naturezas-mortas) e uma técnica tão antiga quanto a têmpera a ovo a partir de questões contemporâneas e de sua
experiência de vida. Sua pintura remete ao exílio, à desterritorialização, a um senso de estar no mundo, ciente de privilégios e das consequências das próprias escolhas.
Individualidade, solidão, trânsito, deslocamento são vivenciados a partir de lugares de gênero, de etnicidade e de classe. Ela é referência para artistas que se interessam pela
capacidade de comunicação da pintura: a concisão de suas estratégicas compositivas, seu arguto senso cromático, sua metodologia obsessiva, colaboram não para um formalismo encerrado
em si mesmo, mas que se nutre de perguntas acerca da intersubjetividade e da agência do mundo sobre nós. O que a pintura dá a ver e a quem? Como se estabelece a conexão entre artista
e público? No que a pintura contribui para a percepção do mundo que nos cerca, que habitamos e que nos habita?
Reunindo obras de coleções públicas e privadas, a maior parte delas inédita, a exposição também apresenta fotografias, cartões-postais e estudos – que fazem parte do arquivo da
artista, recentemente doado ao MAC USP. Os documentos demonstram o processo de criação de Koch e suas indagações sobre a natureza da imagem, da perspectiva e do enquadramento.
A metáfora do título da exposição remete ao cinema: “cena” é a unidade dramática de um roteiro, que pode ser coberta a partir de vários ângulos, chamados de planos ou tomadas.
Muitas das obras parecem cenários para acontecimentos que acabaram de se dar ou ainda estão por se realizar. A quase total ausência da figura humana é contradita pela presença
reiterada de objetos carregados de afetividade, personagens de um enredo silencioso.
A analogia cinematográfica também estrutura a exposição, organizada a partir dos gêneros pictóricos em relação aos tipos de enquadramento: as paisagens que remetem a planos gerais
(marinhas, desertos e jardins); interiores remetem plano médio; e as naturezas-mortas aos primeiros e primeiríssimos planos. O pensamento cinematográfico que rege seus
enquadramentos, planos-sequência e cortes reverbera na forma como o espaço da exposição foi concebido. O público é convidado para um travelling sem percurso predeterminado,
um mergulho numa narrativa aberta. Pois se a pintura de Koch sempre partiu de uma série de intenções conscientes, para a artista seus trabalhos deveriam manter um espaço aberto às
sensações e aos significados construídos pelo público, que por eles se deixa afetar.
Fernanda Pitta
Curadora