23 JAN 2015 - 14 JUN 2015
Entrada Gratuita

 

Olhares Cruzados nos Museus da USP – Identidades Diversas

Calculadora Logos 270, Olivetti, Guarulhos-SP, 1974

MUSEU DE ZOOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

O Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo abriga uma das maiores coleções de animais brasileiros do mundo, usada como base para uma pesquisa tradicional e paradoxalmente cada vez mais contemporânea. Incorporado à USP em 1969, tem como sua principal atividade atribuir identidade a entes naturais conhecidos como espécies. Sua coleção é base para identificação de espécies por pesquisadores nacionais e internacionais.
A taxonomia sofreu profundas transformações ao longo da história. Novos paradigmas, como a teoria evolutiva, mudaram a sua característica de disciplina descritiva para analítica. Novas tecnologias, como a biologia molecular, forneceram novas evidências para o estabelecimento de hipóteses para o reconhecimento de novas espécies. Entretanto, é a crise da biodiversidade atual que coloca esta disciplina no centro de nossa atenção. Com nosso planeta abrigando mais de sete bilhões de seres humanos exercendo enorme pressão sobre ambientes naturais, a urgência do presente nos coloca diante da missão de interpretar a diversidade antes que seja extinta. A taxonomia se desloca para o centro de uma das questões mais importantes no século 21: descrever e estudar espécies para tentar mitigar as ações humanas que provocam seu desaparecimento: conhecer para preservar.

VERBETES

Peixe Macunaíma
Identidade aos milhares
Revoada de descobertas
Diga-me o que comes que te direi quem és
Diga-me como ages que te direi quem és
Múltiplas formas, uma única identidade
Identidade e preservação
Isto não é tudo...

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Peixe macunaíma: herói sem nenhum caráter :topo:

Em 2003, a National Science Foundation dos EUA financiou um ambicioso projeto para aumentar o conhecimento sobre os bagres do mundo. Esse foi o primeiro descrito pela equipe do laboratório de Ictiologia depois de uma expedição ao rio Araguaia e tornou-se nosso herói. Em geral, espécies são descritas por possuírem algum caráter exclusivo. Essa apresenta apenas uma combinação única de caracteres que, juntos, só ela os possui. Recebeu o nome Ituglanis macunaima: herói sem nenhum caráter (taxonômico), baseado no personagem de Mario de Andrade que tinha características infantis em uma alusão também à forma dos adultos desta espécie.

Besouro Serra-Pau:topo:

Identidade aos milhares - O desafio de descrever a biodiversidade não é proporcional entre todos os grupos de organismos. Um geneticista britânico disse: Deus, se existir, tem uma desproporcional predileção pelos besouros. Isto se deve à diversidade e abundância destes insetos na natureza. Trabalhar com grupos muito diversos torna a tarefa de descrever espécies muito mais desafiadora. A história do Prof. Ubirajara Martins de Souza é emblemática. Atuando no MZ desde 1959, ele descreveu cerca de 2.000 espécies de besouros serra-paus (família Cerambycidae). Sua contribuição para o conhecimento deste grupo, com cerca de 35.000 espécies conhecidas, é notável.

Revoada de descobertas:topo:

Podemos considerar como usual a descrição de milhares de espécies de insetos mas nos surpreendemos sempre que aparecem novos mamíferos ou aves. Além de menos diversos, os animais de maior porte não passam despercebidos por nós a não ser em zonas remotas do planeta. Desta forma, um trabalho de 2013 chamou a atenção internacional: descrevia 15 novas espécies de aves amazônicas. O curador da coleção de Ornitologia - uma das maiores do mundo de aves brasileiras - participou desta descoberta.

Diga-me o que comes que te direi quem és:topo:

Muitas vezes o interesse pela biodiversidade está associado ao uso que dela fazemos. Algumas espécies possuem valor comercial e seu conhecimento pode ser crucial para segurança alimentar, saúde pública ou para a indústria. As ostras são muito apreciadas como alimento e deveriam ser bem conhecidas por nós e de longa data. Um trabalho da equipe da Malacologia, de 2014, nos mostrou que a identidade das ostras mais consumidas no Brasil ainda não estava resolvida. Agora sabemos que as espécies que consumimos são a Cassostrea brasiliana e Cassostrea mangle e não a caribenha Cassostrea rizophorae.

Diga-me como ages que te direi quem és:topo:

Comportamento animal também faz parte da identidade de espécies. Formigas operárias de Cephalotes specularis imitam a postura e a forma da espécie Crematogaster ampla e roubam os recursos alimentares da última que ainda garante a segurança territorial. As formigas C. specularis também produzem feromônios iguais aos da imitada. A equipe do MZ descreveu em 2014 o comportamento destas espécies do Cerrado, conhecido como uma forma de parasitismo social. Indivíduos de uma espécie vivem dos recursos de outra enganando a colônia hospedeira por meio de uma sofisticada farsa biológica.

Múltiplas formas, uma única identidade :topo:

A complexidade na identificação de uma espécie aumenta quando machos e fêmeas diferem muito entre si e quando o mesmo indivíduo passa por diferentes estágios durante seu desenvolvimento. No caso das borboletas estes desafios vêm em conjunto. Em 2009, o curador de Lepidoptera publicou um estudo lançando mão da criação de animais em laboratório de duas espécies próximas (Calycopis bellera e Calycopis janeirica) para atribuir a correta identidade dessas borboletas e a correta associação entre seus machos e fêmeas.

Identidade e preservação:topo:

A Mata Atlântica é um hotspot: com até 8% da biodiversidade global e alto grau de endemismo, possui apenas cerca de 12% de sua área original. Um estudo do laboratório de Isoptera sobre as espécies de cupins que ocorrem em toda a sua extensão identificou 87 espécies das quais a metade era nova para a ciência. O estudo mostrou que estes animais, que se alimentam de madeira em diferentes estados de decomposição e/ou do solo da floresta, dependem da temperatura e por isso quanto mais ao norte mais diversos e abundantes. Este estudo deve orientar medidas de preservação considerando a importância que os cupins têm para a formação dos solos.

Isto não é tudo...:topo:

A descrição de espécies é uma das nossas principais atividades. Justifica a continua formação de pesquisadores na área que começam seu processo de aprendizado na graduação e permanecem na instituição por longos anos. A demanda por conhecimento é imensa. No laboratório de Diptera, por exemplo, uma Família desconhecida de moscas será descrita com 300 novas espécies! São novas lagostas e caranguejos, novos peixes, sem falar dos besouros... Esta é uma pequena amostra das novas espécies previstas para publicação em 2015.





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