2 SET 2017 - 26 NOV 2017
Entrada Gratuita

 

Somente o Necessário


Entre as imagens e as coisas

É num campo de forças milimetricamente projetado que Marcelo Zocchio nos instiga a pensar sobre a relação entre as imagens e as coisas. Dono de uma trajetória sólida e coerente, como se viu na mostra retrospectiva realizada no ano passado na cidade, o artista há muito vem se dedicando ao exercício de construção/desconstrução das representações. Em parte de suas obras, o que se vê são imagens que se rebelam contra o plano da parede por meio de extensões tridimensionais que avançam rumo ao observador. Em outras, da série denominada Equações (2015), o artista adota um procedimento metódico e programado, que se inicia com o recolhimento de madeiras descartadas e resulta na construção de uma peça de mobiliário, deixando para trás uma quantidade mínima de sobras.

Na exposição, que ora se apresenta, Zocchio intensifica a investigação sobre a dimensão espacial que permeia o seu trabalho. Aqui ele funde os princípios da série Equações com os desafios de criar uma instalação interativa, que convida o visitante a uma experiência espaço-temporal. Ao entrar, vê-se três cadeiras, uma mesa e um cabideiro, acompanhados de fotos do atelier do artista, organizadas em dípticos. Nas paredes estão os registros fotográficos da madeira bruta com a qual os objetos foram construídos. Logo ao lado, as fotografias apoiadas no chão sustentam as sobras do trabalho de marcenaria, resultando em relevos quase abstratos, imagens fantasmáticas, que somente ganham sentido quando se desvenda a estreita correspondência existente entre elas e os objetos dispostos no espaço expositivo. Cabe, portanto, ao observador desvelar as intrincadas relações entre as fotografias, as foto-objetos e os objetos, propriamente ditos, recuperando os laços que ligam conceito, projeto, desenho e construção. Das imagens nascem coisas e das coisas nascem imagens, num jogo de reverberações nada óbvio.

Diante das cadeiras de Zocchio, é impossível não lembrar da emblemática obra de Joseph Kosuth, Uma e três cadeiras, de 1965. O artista norte-americano nos confronta com três modos de representação, socialmente convencionados, do que seria o conceito abstrato de cadeira. Embora seja tributário das vertentes conceituais e do fenômeno que levou a fotografia a avançar para um "campo expandido" na década de 1970, Zocchio situa seus questionamentos no momento presente. O artista subverte a lógica do desperdício, resiste à dependência do novo e à desenfreada proliferação de imagens na iconosfera em que vivemos. Somente o necessário* funda-se sobre princípios éticos que questionam certo modo de vida contemporâneo. Sem nunca cair em dualidades redutoras ou simplificações previsíveis, nos subtrai da avalanche do tempo produtivo e nos devolve à simplicidade das experiências tangíveis.

* Somente o necessário é resultado de um projeto premiado no Edital ProAC n.15/ 2016, da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo. O MAC USP agradece à Secretaria pelo apoio e ao artista Marcelo Zocchio pela oportunidade desta parceria.

Helouise Costa
Curadora MAC USP




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