28 MAI 2016 - 10 JUL 2016
Entrada Gratuita

 

Vesica Piscis | Laban em Fluxo


ANDREIA YONASHIRO
UMA BALEIA ENCALHADA NA PRAIA

Há dez anos medito sobre a criação de uma dança com o título: Uma baleia encalhada na praia. Inúmeros movimentos me conduziram a percorrer esse título como se fosse uma nova galáxia, com seu caos e seus padrões a serem sentidos como vestígios corporais que tento tocar, sem, no entanto, domesticá-los. Essa galáxia-título é ponto de convergência de uma situação limite que sustenta a dúvida como música que vem e vai, na água insistente que penetra por baixo, na areia insistente que abraça por baixo. A paisagem engole um corpo e assim, o ar transforma o peso, e ir para baixo significa ir para frente. Calor, gordura e respiração condensando um futuro que corre para trás cada vez mais rápido em busca de um som que ecoa quilômetros de nado livre. Paradoxalmente, lançar-me ao desafio de criar um sentido coreográfico que retorne sempre ao sentimento de início, sustentar um começar sem ecoar a palavra finalizar.

Não é do nosso interesse falar sobre o que o trabalho é, de fato, nós não sabemos nada sobre sua totalidade ou significado. Uma mulher grávida diante de um monte de pedras, com duas linhas musicais que geram percepções espaciais e o brilho do reflexo da luz sobre as pedras. Seria somente uma materialidade que anima a ideia coreográfica exposta anteriormente. Tudo em jogo, orgânico ou inorgânico, imaginação ou percepção, pulsando o pensamento de Hélio Oiticica de que a dança é simplesmente clímax corporal.

Meu corpo dedica-se à manifestação orgânica do que foi construído em anos de trabalho com Joana Lopes, numa pesquisa que, a partir da obra labaniana, propõe uma nova relação entre arte e ciência. Chamamos de Coreotopologia esse outro campo que aproxima a arte do movimento à física subatômica e à topologia para conceber uma outra maneira de compor movimentos como linguagem artística. E de maneira mais geral, é uma proposta que substitui a noção de improvisação em dança por uma reaproximação da dança ao jogo.

O convite de Maria é então mais que oportuno, me obriga a encarar de frente o medo de, nessa circunstância, me entregar a uma ideia coreográfica e a colocar em jogo tudo o que sei e não sei a respeito de meu próprio corpo e de minha dedicação ao estudo da dança, da coreografia e da arte do movimento. Impondo um retorno ao precioso escondido em mim daquilo que Joana Lopes me apresentou dessa sabedoria e ciência do olhar para o movimento que Rudolf Laban propôs como início e sentido de uma arte.

Esse trabalho é dedicado a João da Silva, morador de uma ilha do Xingu, a Barriguda, que teve sua casa incinerada para construção da Usina de Belo Monte. Sua história me ajuda a compreender intuitivamente com quais forças estamos lidando, me colocando em contato com aquilo que realmente me afeta, apesar das distâncias e diferenças. A própria usina sempre me lembrou uma baleia encalhada e ao que parece, sua vida e seu corpo estão sendo consumidos lentamente por essa paisagem, impondo a João um destino semelhante *.

Ficha técnica
Idealização: Andreia Yonashiro
Criação: Andreia Yonashiro, Marion Hesser e MarciusLindner
Performance: Andreia Yonashiro
Direção musical e violinista: Felipe Secamilli
Cantor convidado: Matheus França
Criação de brilho: Ricardo Palmieri
Consultoria em luz: André Boll
Colaboradora artística: Júlia Rocha
Duração: 20'
Classificação indicativa: Livre

*para mais detalhes, ver o texto Dilma compôs seu réquiem em Belo Monte, Eliane Brum, El País , 10mai.2016.

 

 





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