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Entrada Gratuita

O Pernambuco Cósmico de Suanê


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Educativo:
55 11 2648-0258
Agendamento

Imprensa:
Sérgio Miranda
55 11 2648-0299

MAC USP
Av. Pedro Álvares Cabral, 1301 - São Paulo-SP, Brasil
Horário de funcionamento:
Terça a domingo das 10 às 21 horas
Segundas: fechado
Entrada gratuita

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MAC USP

O MAC USP, museu público e universitário, busca incentivar a reflexão acerca da produção artística moderna e contemporânea, bem como de suas formas narrativas na história da arte. Revisões dos cânones, contranarrativas e discussões sobre o protagonismo de agentes subalternizados na história da arte são compromissos assumidos pelas pesquisas realizadas no Museu e no âmbito de seu programa de exposições. Por esses motivos o museu acolhe a mostra O Pernambuco Cósmico de Suanê, fruto da longa pesquisa e do trabalho de organização do projeto Suanê, com curadoria de Tálisson Melo, pós-doutorando nesta universidade. A trajetória de Suanê tem intensos pontos de contato com a história do MAC USP e de suas coleções, sendo representada em seu acervo por duas obras advindas da antiga coleção do MAM SP, porém, seu trabalho é ainda pouco conhecido do público mais amplo. A retrospectiva agora apresentada oferece a oportunidade de um exame detido de sua obra, atenta à inventividade da cultura popular, à experimentação formal e técnica, à memória e à identidade.

Fernanda Pitta
Curadora responsável - MAC USP

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O Pernambuco Cósmico de Suanê

Suanê é o nome escolhido por Lúcia de Barros Carvalho para ser chamada desde sua adolescência. Segundo ela, esse nome lhe foi dado por um pajé na aldeia do povo indígena Fulni-ô, ao redor da vila de Águas Belas, interior pernambucano, onde viveu os momentos mais marcantes de sua infância. Nascida num engenho da região de Palmares, em 1922, itinerou com familiares por outras vilas da região, até as cidades de Recife e Olinda, de onde migrou definitivamente para São Paulo, em 1940. Nesse deslocamento, carregou uma profusão de memórias reavivadas em cantigas e contos, pontuando sua prosa ao se apresentar para a cena modernista da maior cidade do país. Uma jovem que se recusava a perder as raízes, insistindo em florescer com frutos próprios das terras de sua lembrança: os costumes, as celebrações populares, lendas, histórias, personagens das feiras e cultos, do imaginário sobre a passagem do bando de cangaceiros, a vida nos engenhos, nas ruas, na aldeia, elementos da cosmologia Fulni-ô e católica que se fundiam.
Começou a pintar em 1945, incentivada por seu marido, Nelson Nóbrega (pintor acadêmico, integrante tardio do grupo Santa Helena nos anos 1930), a fazer visível tudo aquilo que ela cantava e contava. Em poucos meses, criou vários quadros, reunindo 35 deles para sua primeira exposição, inaugurada em abril de 1946, na Galeria Itá, centro de São Paulo. No convite, a frase “temas pernambucanos”, sob o nome da artista, situava as cenas e figuras de suas têmperas, o que era reforçado com os títulos de cada obra. A repercussão de suas primeiras obras foi significativa, sendo comentada por críticos destacados da época, embora tomada pelo calor de uma discussão mais ampla que a circunscrevia nas disputas em torno a ideias como “arte popular” e “regional”.
No início da década de 1950, Suanê apresentou obras em coletivas, como a I Bienal Internacional de São Paulo, e o Salão Paulista de Arte Moderna. Chamada para pintar afrescos no batistério da Capela do Morumbi, criou uma cena do batismo de Cristo rodeado por anjos de feições indígenas. Daí em diante, Suanê seguiu produzindo suas pinturas intensamente, porém, optando por uma circulação mais restrita de seu trabalho, que foi mostrado em poucas exposições posteriores, contribuindo para o gradual apagamento de sua presente atuação por sete décadas inteiras de trabalho, até seu falecimento, em 2020. Nesse longo período, com o passar dos anos, sua produção se transformou, evidenciando a incorporação de elementos de várias proposições estéticas de diferentes momentos, se desdobrando em diversas fases. As cenas e personagens das têmperas dos anos 1940 vão desembocar em uma explosão abstratizante de suas partes em grandes recortes de madeira pintados a partir de 2010. Na mesma época, os retratos de familiares, as calças, bolsas, vestidos, tranças, portas, janelas, cortinas e decorações de festas recobram a figuração em experimentações com outros materiais e escalas agigantadas. Nas pinturas de 1980 e 1990 chamadas de “cósmicas” pela própria artista — constelações dinâmicas de linhas, formas, cores e símbolos —, a intenção de desbravar outra espacialidade se manifesta de maneira definitiva. Essa fase específica lança luz a toda sua produção anterior e posterior, fazendo de seu Pernambuco, visto como local, tão específico, um manancial para se refletir o universo.
Esta exposição reúne cerca de 60 obras de Suanê, oferecendo uma retrospectiva por todas as fases de sua produção artística desenvolvida entre a cidade de São Paulo e temporadas em Itanhaém, litoral do Estado. Desse lugar, os trabalhos criados por ela expressam sua conexão constante com seu território originário, vínculo mantido aceso por lembranças-fabulações que expandem um certo Pernambuco à escala do cosmo. Esta mostra também busca instigar o olhar e a reflexão sobre as vidas e obras de artistas que, buscando caminhos genuínos para sua expressão, evidenciam um emaranhamento complexo entre referências artísticas diversas que coexistem para além do encadeamento de uma narrativa monolítica de “evolução” nas artes visuais entre os séculos XIX e XXI.
As bandeirinhas pintadas por Suanê de 1946 a 2019, por exemplo, indicam mais um caminho crucial para a decifração da formação de um ícone popular na arte brasileira - e que se difundiu especialmente através da obra de Alfredo Volpi em diferentes momentos de sua circulação. Nas obras de Suanê, essas formas persistem conectadas a seus referentes, são figurações da presença da festa, do culto ao divino, da artesania, da possibilidade de inventar um espaço e colorir o imaginário, a memória, a identidade. Mesmo em se tratando de um contexto também caracterizado pela fome, seca e desigualdade históricas, as cores de suas bandeirinhas, laços, fitas, frutas, linhas, personagens e paisagens, marcam a presença pulsante da transcendência e da vida.

Tálisson Melo
Curador

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