25 JAN 2020 - 26 ABR 2020
Entrada Gratuita

 

VOCÊ ESTÁ AQUI | por Tadeu Jungle


Sobre a intervenção | Tadeu Jungle

_____

Onde estou agora?
[english]

Daniel Rangel
Curador e mestre em artes visuais pela ECA USP

o olhoouvido ouvê - Décio Pignatari

Em 1956, em um manifesto, Augusto de Campos afirmou “poesia concreta: tensão de palavra-coisas no espaço-tempo” . O artista-poeta abordava a junção do caráter subjetivo da linguagem com a fisicalidade da representação desta e a união simultânea das dimensões espaciais e temporais em poemas visuais concretos. Em Você está aqui (1997), Tadeu Jungle levou essa definição às últimas consequências, incorporando ainda outras influências, como o readymade de Marcel Duchamp e um de seus desdobramentos dos anos 1960, a pop art.

Cineasta, fotógrafo, poeta e artista visual, Jungle tem a multidisciplinaridade intersemiótica e inquietude criativa como características centrais de sua produção e personalidade. O multiartista é herdeiro direto do trio Noigandres, de Augusto e Haroldo de Campos e Décio Pignatari; e de artistas plurais dos anos 1980 da cena paulistana, como Zé Celso Martinez Corrêa, Ivald Granato e José Roberto Aguilar, com os quais manteve intenso diálogo. Desde o começo de sua trajetória, vem explorando diferentes linguagens para se expressar, e realizou vídeos, em que além de dirigir, muitas vezes atuou; poemas visuais em distintos suportes, como pichações, adesivos e objetos poéticos, além de serigrafias, fotografias, pinturas e instalações cujas palavras e imagens se encontram com frequência.

A afirmação embutida em Você está aqui torna o leitor um cúmplice invariavelmente consciente do significado da frase. No ato da fruição ativa-se uma auto-percepção do aqui e do agora, um dos preceitos do budismo, que fez com que o autor denominasse-o de “poema zen”. O sentimento é amplificado pela potência visual das instalações realizadas por Jungle com o poema, desde o final dos anos 1990. O trabalho, no entanto, apareceu para o artista ainda em 1981, quando em uma “viagem mochileira” pela Europa, ao tentar se localizar em um mapa de uma estação de trem, percebeu a falta da clássica inscrição do “você está aqui”. O adesivo da frase havia descolado e estava caído na moldura de vidro do mapa, tornando impossível a identificação do local onde ele realmente se encontrava naquele momento. A ideia ficou guardada em anotações de cadernos, e em 1997, em um ato duchampiano, o artista se apropriou do seu “achado perdido” e o deslocou como obra de arte em uma exposição na galeria Valu Oria, em São Paulo.

O primeiro suporte que utilizou para formalizar o Você está aqui foi o adesivo (“sticker”), o qual já havia experimentado em poemas visuais anteriores, como os provocativos Fure Fila (1978) e Passe a mão (1979), que então o artista chamara de “plastic graffiti”. Depois vieram camisetas, copos de vidro, relógios de mesa, caixas de fósforo, plotagens, pinturas, um painel de led no Vale do Anhangabaú, e até mesmo adesivos em inglês – “You are here”, que Jungle espalhou pelo mundo durante suas recorrentes viagens. A potência semântico-visual obtida pela presença física e significante da arte minimalista composta por letras brancas em fundo vermelho de Você está aqui tornou-se uma espécie de logomarca pop sem marca.

Em 2013, na exposição que realizou no Oi Futuro do Rio de Janeiro, Jungle montou uma verdadeira ocupação espacial com o Você está aqui, que foi colado em dezenas de degraus da escada do local, além de paredes e janelas. Antes disso, na mesma cidade, o artista realizou uma “performance aérea” na qual se apropriou de um avião de publicidade com uma faixa vermelha afixada e as palavras do poema escritas horizontalmente em branco, para sobrevoar a orla da zona sul carioca. Até então, este tinha sido o maior formato que o poema havia sido exibido. A plotagem agora montada no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, com 30 metros de altura e 18,4 metros de base, extrapolou todas as versões anteriores, e provavelmente é o maior poema visual já apresentado no Brasil com 552m2. A área corresponde a mais de uma dezena de estúdios residenciais, destes vendidos no centro da cidade, e desde que o projeto foi idealizado por Jungle e apresentado para a instituição, demorou mais de três anos para ser concretizado.

A dimensão descomunal da instalação, que pode ser vista a quilômetros de distância, e provavelmente até mesmo do céu, causa um impacto inerente ao ambiente e aos transeuntes do seu entorno. Além da necessária mensagem zen exibida, em meio ao caos da urbis, o poema chama atenção para o local onde está instalado – o MAC USP. O prédio ainda é lembrado e percebido por muitos como sede do DETRAN, porém a obra instalada na fachada cega do edifício de Oscar Niemeyer deve criar uma “tensão de palavras-coisa no espaço-tempo” e fazer com que as pessoas se perguntem: onde estou agora? A resposta virá como um poema visual concreto: objetivo, impactante e direto – você está aqui.

[topo]


_____
[português]

Where am I now?
Daniel Rangel
Curator and Master in Visual Arts at ECA USP

o olhoouvido ouvê - Décio Pignatari

In 1956, in a manifesto, Augusto de Campos stated "concrete poetry: tension of word-things in space-time" . The artist-poet addressed the junction of the subjective character of language with the physicality of its representation and the simultaneous union of spatial and temporal dimensions in concrete visual poems. In Você Está Aqui (You Are Here) (1997), Tadeu Jungle took this definition to the last consequences, incorporating yet other influences, such as Marcel Duchamp's readymade and one of his 1960s developments, pop art.

Filmmaker, photographer, poet and visual artist, Jungle has the intersemiotic multidisciplinarity and creative restlessness as central features of his production and personality. The multiartist is the direct heir of the trio Noigandres, by Augusto and Haroldo de Campos and Décio Pignatari; and from 1980s plural artists from the São Paulo scene, such as Zé Celso Martinez Corrêa, Ivald Granato and José Roberto Aguilar, with whom he maintained an intense dialogue. Since the beginning of his career, he has been exploring different languages to express himself, and has made videos, in which in addition to directing, he often acted; visual poems on different media, such as graffiti, stickers and poetic objects, as well as serigraphy, photography, paintings and installations whose words and images are often found.

The statement embedded in Você Está Aqui makes the reader an accomplice invariably aware of the meaning of the sentence. In the act of fruition, a self-perception of the here and now is activated, one of the precepts of Buddhism, which led the author to call it a “Zen poem”. The feeling is amplified by the visual power of Jungle's installations with the poem since the late 1990s. The work, however, appeared to the artist as early as 1981, when on a "backpacking trip" through Europe; he tried to locate himself on a train station map, and noticed that the classic "you're here" inscription was missing. The phrase's sticker had peeled off and was lying on the glass frame of the map, making it impossible to identify where he really was at that time. The idea was kept in notebook notes, and in 1997, in a Duchampian act, the artist appropriated his “lost found” and presented it as a work of art in an exhibition at the Valu Oria gallery in São Paulo.

The first support he used to formalize the Você Está Aqui was the sticker, which he had already experimented with in previous visual poems, such as the provocative Fure Fila (1978) and Passe a Mão (1979), which then the artist called it "plastic graffiti". Then came T-shirts, glass cups, table clocks, matchboxes, prints on vinyl, paintings, an LED panel in the Anhangabaú Valley, and even stickers in English - "You are here", which Jungle spread throughout the world during his recurrent trips. The semantic-visual power gained by the physical and significant presence of minimalist art made up of white letters on a red background of Você Está Aqui has become a kind of unmarked pop logo.

In 2013, at the exhibition held at Oi Futuro in Rio de Janeiro, Jungle set up a true space occupation with the Você Está Aqui, which was glued to dozens of stair steps on the site, along with walls and windows. Prior to that, in the same city, the artist carried out an “air performance” in which he used a publicity plane with a red banner affixed and the words of the poem written horizontally in white to fly over the southern seafront of Rio. So far, this had been the largest format the poem had been exhibited. The printing on adhesive vinyl now installed at the Museum of Contemporary Art of the University of São Paulo, which is 30 meters high and 18.4 meters base, extrapolated all previous versions, and is probably the largest visual poem ever presented in Brazil with 552m2. The area corresponds to more than a dozen residential studios sold in the city center, and since the project was conceived by Jungle and presented to the institution, it has taken over three years to complete.

The sheer size of the facility, which can be seen from miles away, and probably even from the sky, has an inherent impact on its surroundings and bystanders. In addition to the necessary Zen message displayed in the chaos of urbis, the poem draws attention to where it is installed - the MAC USP. The building is still remembered and perceived by many as the headquarters of DETRAN (São Paulo State Traffic Department), but the work installed on the windowless facade of Oscar Niemeyer's building must create a “tension of thing-words in spacetime” and make people wonder: where am I now? The answer will come as a concrete visual poem: objective, impactful and straightforward - you are here.

[top]

_____
Você está aqui: diálogos entre o museu, o artista e a cidade
MAC USP

A proposta para a intervenção Você Está Aqui, de Tadeu Jungle, na empena lateral do Museu, foi apresentada ao MAC USP ainda em 2016. Desde então, o projeto passou por várias etapas para que, viabilizado técnica e administrativamente, pudesse finalmente ser instalada em 25/1/2020 – ocasião do 466ª aniversário de fundação da cidade de São Paulo.

A primeira etapa consistiu na elaboração da documentação necessária para a abertura dos processos de autorização pelos órgãos de preservação do patrimônio. O edifício onde o MAC USP atualmente está instalado é tombado como parte do Complexo Arquitetônico do Parque do Ibirapuera projetado por Oscar Niemeyer, e qualquer intervenção em sua fachada, mesmo que temporária, deve ser aprovada pelo IPHAN, pelo CONDEPHAAT e pelo CONPRESP.

Nesse sentido, a definição do suporte a ser utilizado foi etapa fundamental do processo. Além de resistir às intempéries e variações climáticas, o material deveria ser de fácil aplicação e remoção, de forma a não deixar resíduos nas pastilhas nem interferir de maneira definitiva na empena do edifício. Artista, fornecedor e servidores do MAC participaram dos testes de aplicação de películas que, após três meses, foram facilmente retiradas, sem nenhum indicativo de dano à fachada do prédio.

Somente após aprovação pelos órgãos de preservação, já em 2018, o projeto foi inscrito pelo artista em programas de incentivo à cultura. A aprovação no Edital PROAC, em 2019, finalmente permitiu a instalação da obra, que ocupará a empena do edifício do MAC até 26/4/2020.

[topo]






_____
GALERIA

[topo]





© 2020 - Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo