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Um dia terá que ter terminado 1969/74 é a segunda de uma série de três exposições que tem como objetivo investigar a constituição do acervo do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MACUSP), tendo como foco a arte brasileira produzida no contexto da ditadura militar (1964-1985). As mostras foram programadas para cobrir três momentos distintos: 1964-1968; 1969-1974 e 1975-1985. Estas balizas cronológicas foram determinadas em função do contexto político local, levando em conta, respectivamente, a dinâmica de implantação, o recrudescimento e a distensão do regime de exceção. Trata-se de duas décadas cruciais da história recente do país sobre as quais muito ainda há que se refletir, em especial no campo das instituições artísticas.

O MAC USP foi fundado em abril de 1963, um ano antes do golpe militar desfechado em 1964. Na primeira exposição desta série problematizamos a formação do acervo de arte contemporânea do Museu no início da ditadura. Já nesta mostra indagamos como se deu a expansão desse acervo nos anos mais cruéis do regime, antes que se fizessem sentir os primeiros sinais da abertura política. O conjunto de obras que ingressou no acervo do MACUSP entre 1969 e 1974 aponta, entre outras coisas, para a criação e desenvolvimento de uma rede de trocas de arte postal, cuja capacidade de romper bloqueios foi inversamente proporcional ao fechamento político e ideológico vivido naquele momento. Valendo-se dessa rede foram organizadas algumas exposições, com destaque para a Prospectiva 74. O acervo do Museu ganhava assim uma representatividade internacional notável na arte contemporânea. Vale ainda notar no conjunto apresentado as estratégias utilizadas na elaboração e circulação de muitas modalidades de publicações de artistas que redefiniram o conceito moderno de obra de arte.

Entre 1973 e 1974 o MACUSP apresentou pela primeira vez, no Brasil, trabalhos em vídeoarte. Despontava então, como um museu-laboratório, acolhedor das experimentações realizadas pelos artistas muitas vezes no próprio Museu. A fusão entre espaço de contemplação, criação e experimentação artísticas estava na base do projeto do diretor Walter Zanini (1963-1978). A fotografia, por sua vez, se apresenta não apenas na forma direta, mas principalmente enquanto imagem apropriada, retrabalhada em diversas obras. Ao mesmo tempo, e lado a lado de obras mais experimentais, o MACUSP, enquanto espaço democrático, continuou a acolher e exibir manifestações mais tradicionais da arte.

Uma das obras da exposição, “São Sebastião – Marighella”, de Sérgio Ferro, foi por nós escolhida como emblemática do papel do Museu naqueles anos. Isso porque em correspondência endereçada a Walter Zanini o artista, na iminência de partir para o exílio, solicita que sua obra seja protegida pelo MACUSP e manifesta sua esperança de que a ditadura chegue ao fim. Dessa maneira, mais do que apresentar um conjunto de obras, a exposição Um dia terá que ter terminado 1969/74 busca revelar os embates latentes à própria constituição do Museu, empenhado em se manter como espaço de resistência voltado à pesquisa e à experimentação, atitude que na atual sociedade do espetáculo acarreta outros riscos.

Cristina Freire
Helouise Costa
Ana Magalhães
Divisão de Pesquisa em Arte, Teoria e Crítica