O que temos em comum? Abstracionismos no MAC, 1940-1960
A variedade de obras e teorias que se alojam sob o guarda-chuva do abstracionismo sugere que o termo reúne experiências que nada têm em comum a não ser a recusa em figurar o
mundo. Por outro lado, a ideia de que formas e cores são capazes de exprimir realidades invisíveis – sejam elas, especulações filosóficas, saberes espirituais, estruturas microscópicas,
conceitos matemáticos ou emoções – constituiu uma das crenças mais poderosas da arte moderna. Desde seus primórdios, por volta de 1910, diferentes vertentes da arte abstrata se apoiaram
na confiança de que, sem o compromisso de representar personagens, paisagens, mitos ou cenas, os artistas estariam livres para se concentrar em desafios próprios do métier. Argumentava-se
também que uma arte não figurativa seria equivalente a uma linguagem universal, capaz de transpor contingências naturais, culturais e históricas. Essas convicções se tornaram dogmas que vem
sendo desmantelados por artistas e pensadores há cerca de 60 anos.
O MAC USP possui um dos mais importantes acervos de arte abstrata nacional e internacional do Brasil. O museu foi criado em 1963 após o antigo Museu de Arte Moderna de São Paulo, à época
dirigido pelo empresário Francisco Matarazzo Sobrinho, doar toda sua coleção à USP. Aquele conjunto, em parte adquirido no contexto da Bienal de São Paulo, era especialmente representativo
da produção artística do segundo pós-guerra, marcada pela expansão do abstracionismo em vários países. Depois disso, o MAC USP continuou a incorporar trabalhos abstratos à sua coleção, que
viriam a ampliar ainda mais os conceitos e classificações anteriores.
Esta exposição reúne obras nacionais e internacionais do acervo do MAC USP, produzidas entre as décadas de 1940 e 1960, quando os abstracionismos estiveram associados a visões de mundo
que emergiram após 1945. Ainda que a fantasia de uma arte autônoma e universal continuasse sendo perseguida, as poéticas abstratas do período partiram de motivações variadas e mesmo
conflitantes entre si. Alguns viram na matemática as bases para uma linguagem visual pretensamente objetiva; outros perseguiram o ideal de uma expressão livre e individual, apreensível por
meio de gestos. Além disso, diversos trabalhos possuem títulos que fazem referência à natureza ou a eventos históricos, deixando claro que nem todo abstracionismo esteve pautado na
dicotomia entre abstração e figuração. Outros evidenciam que a oposição entre geometria e gesto também não foi um consenso, pois havia os interessados em criar diálogos entre esses dois
pólos. Em sua diversidade, as obras aqui reunidas não só continuam a despertar nosso interesse e a impactar nossos sentidos; elas enfatizam a necessidade de continuar interpelando os
processos que levam à arte abstrata e problematizar os princípios de universalidade a que foram vinculadas.
O MAC USP é um espaço de ensino. A exposição inclui verbetes produzidos por estudantes de graduação e pós-graduação nos cursos de história da arte do Museu.
Heloisa Espada
curadora
Maria Carolina Boaventura
Assistente de curadoria
What do we have in common? Abstractionisms in the MAC USP 1940-1960
The variety of works and theories that fall under the umbrella of abstractionism suggests that the term brings together experiences with nothing in common other than a refusal to
depict the world. On the other hand, the idea that shapes and colors are capable of expressing invisible realities—be they philosophical speculations, spiritual knowledge, microscopic
structures, mathematical concepts, or emotions—grew into one of the most powerful beliefs in modern art. Since its beginning, around 1910, different branches of abstract art have relied
on the belief that, without commitment to represent characters, landscapes, myths, or scenes, artists would be free to focus on challenges specific to the métier. Arguments that
nonfigurative art would be equivalent to a universal language, capable of overcoming natural, cultural and historical contingencies were also raised. These convictions became dogmas that
are continuously dismantled by artists and intellectuals for about 60 years.
The Museum of Contemporary Art of the University of São Paulo (MAC USP) holds one of Brazil’s most important collections of national and international abstract art. The museum was created
in 1963, when the Museum of Modern Art of São Paulo, at the time directed by businessman Francisco Matarazzo Sobrinho, donated its entire collection to USP. This collection, partly acquired
from the São Paulo Biennial, was especially representative of post-Second World War artistic production, a period marked by the expansion of abstractionism in several countries. MAC USP
continued to incorporate abstract works into its collection, which would further expand previous concepts and classifications.
This exhibition brings together national and international works from the MAC USP collection, produced between the 1940s and 1960s, when abstractionism was associated with worldviews that
emerged after 1945. Although the fantasy of an autonomous and universal art was still pursued, the abstract poetics of the period originated from varied and even conflicting motivations.
Some saw in mathematics the basis for a supposedly objective visual language; others pursued the ideal of a free and individual expression, apprehensible through gestures. The titles of
several works also refer to nature or historical events, underscoring that not all abstractionism was based on the dichotomy between abstraction and figuration. Others show that the
opposition between geometry and gesture was not a consensus either, as there were those interested in creating dialogues between both. In their diversity, the works gathered here not only
continue to pique our interest and impact our senses, but emphasize the need to keep questioning processes that lead to abstract art and question the principles of universality to which
they have been linked.
MAC USP is an educational space. The exhibition includes entries produced by undergraduate and graduate students in the Museum’s art history courses.
Heloisa Espada
Curator
Maria Carolina Boaventura
Curatorial assistant
Galeria











