9 NOV 2019 - 1 MAR 2020
Entrada Gratuita

 

RODRIGO LINHARES | VIVÊNCIAS POR REFLEXO



[english]

No final de 2018, o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo organizou a primeira chamada pública para seleção de três exposições temporárias a serem realizadas em sua sede no Parque do Ibirapuera. Tal ação resultou no recebimento de 190 propostas nas modalidades curadoria, mostra individual e mostra coletiva. O trabalho de seleção teve como parâmetros a vinculação da proposta à política de exposições do Museu, o seu ineditismo e a sua coerência conceitual. Rodrigo Linhares: vivências por reflexo, com curadoria de Adriana Palma, é a primeira dessas exposições.

Ao abarcar o percurso de Linhares, desde meados dos anos 2000 até uma série, datada de 2018, a curadora evidencia o processo de formação e afirmação desse artista por meio das relações que, direta ou indiretamente, ele estabeleceu com o pensamento e as obras de intelectuais e artistas vinculados à trajetória do MAC USP. Destaca-se, nesse contexto, uma obra inédita que o artista produziu especialmente para essa mostra.

A produção de Rodrigo Linhares dialoga com os conceitualismos das décadas de 1960 e 1970 e isso o aproxima ainda mais do Museu, tendo em vista que a vertente conceitual é muito bem representada no acervo da instituição. Artistas como Hervé Fischer, Paulo Brusky, Angelo de Aquino e Rafael França, assim como integrantes do Grupo Fluxus, serviram, em diferentes momentos, de referencial para o processo de criação de Linhares como se poderá reconhecer no conjunto das obras expostas.

Na condição de museu público universitário, o MAC USP busca, por meio das mostras resultantes do edital mencionado, continuar cumprindo a sua missão de difusão e crítica da produção artística contemporânea, apostando na transparência e coerência com a sua história institucional.

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[português]

At the end of 2018, the Museum of Contemporary Art of the University of São Paulo organized the first public call to select three temporary exhibitions to be held at its headquarters in Parque do Ibirapuera. This action resulted in the receipt of 190 proposals in the curatorial, individual exhibition and collective exhibition modalities. The selection work had as parameters the linking of the proposal to the Museum's exhibition policy, its ineditism and its conceptual coherence. Rodrigo Linhares: Experiences by reflection, curated by Adriana Palma, is the first of these exhibitions.

By covering Linhares' career, from the mid-2000 to a series, dated 2018, the curator highlights the process of formation and affirmation of this artist through the relationships that, directly or indirectly, he established with the thought and works of intellectuals and artists linked to the trajectory of the MAC USP. In this context, an unpublished work that the artist produced especially for this exhibition stands out.

The production of Rodrigo Linhares dialogues with the conceptualisms from the Decades of 1960 and 1970 and this brings him even closer to the Museum, considering that the conceptual strand is very well represented in the institution's collection. Artists such as Hervé Fischer, Paulo Brusky, Angelo de Aquino and Rafael França, as well as members of the Fluxus Group, served, at different times, as a reference for Linhares' process of creation as can be recognized in all the works exhibited.

In the condition of a public university museum, the MAC USP seeks, through the exhibitions resulting from the aforementioned public notice, to continue fulfilling its mission of diffusion and criticism of the contemporary artistic production, focusing on transparency and coherence with its institutional history

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Debruçar-se sobre si mesmo concomitantemente a expandir-se para o coletivo é o movimento realizado por Rodrigo Linhares no percurso de obras aqui proposto. Esta exposição pretende alinhavar momentos da trajetória artística de Linhares. Partindo de meados dos anos 2000, quando o artista, muito jovem, tateava linguagens – ainda bastante ligadas às estratégias de artistas conceituais presentes no acervo do MAC USP – até hoje.

Os trabalhos iniciais deixam latente o interesse pelo desenho que o acompanha desde antes do ingresso na faculdade de artes, e ressurge com mais vigor, quando ele assume sua essência e profissão enquanto artista. Referenciais da literatura e do cinema, a manipulação de imagens digitais e o uso da fotografia são fundamentais em sua atuação. Muitos dos seus exercícios poéticos relacionam-se com a arte conceitual das décadas de 1960 e 1970 - arcabouço acessado por Linhares por meio da metodologia de trabalho e pela solução material dada às obras. Em Christmas Projeto (2007-2011), o artista trata das vivências do encontro e das trocas interpessoais. Ele parte de referências da arte relacional para confeccionar carimbos, cartões postais, selos, inserindo em alguns deles mensagens de cunho reflexivo e sentimental, e os envia por correio a conhecidos, nos períodos de Natal.

O ímpeto conceitualista do artista-cientista que disseca, analisa e teoriza a anatomia dos temas, pode ser observado em produções realizadas em torno da ideia e do ato de voar: Aerodinâmica do Voo (2008) e Para se Entender a Aerodinâmica do Voo (2014). O uso de papel e caneta lembra rascunhos de estudos, porém, as anotações trazem excertos de poemas e frases carinhosas, que contradizem a suposta objetividade científica. Em Algorab #10 (2017), o assunto do voo ressurge centrado em imagens de corvos tomadas em inúmeras variações de posições, lembrando análises biológicas do comportamento animal. Evidencia-se uma investigação sobre as representações física e simbólica do corvo. As expressões e atitudes do artista nos autorretratos, que também compõem a fotografia, assemelham-se àquelas das aves e sugerem uma fusão entre homem e bicho.

A pesquisa em profundidade acompanha a formação artística de Linhares e resultou, em 2014, em trabalhos que relativizam padrões naturalizados no circuito das artes, como definições de obra, título, crítica e espectador. Em Ouro de Artista, o que se apresenta enquanto obra de arte é um texto crítico sobre ela. Para descobrir as informações a respeito do texto, o espectador precisa sair de sua usual passividade e acessar um QR code. Em Auto da Fé, abstrações geométricas recebem títulos de pinturas do renascimento italiano. Os dilemas nelas explorados coincidiram com a busca pessoal de Rodrigo em torno do seu lugar nesse campo de atuação hermético e muitas vezes hostil aos próprios artistas.

A ideia de hostilidade já fora abordada com a série Quando Éramos Reis (2012), composta de pôsteres contendo poses de boxeadores famosos. A temática da luta foi revista em A Nobre Arte (2014), na qual aspectos formais das composições relacionam-se com os padrões de cores e formas comuns ao âmbito do boxe. Frases irônicas colocam em xeque a virilidade e a brutalidade do esporte. Essas problematizações expandem-se para várias direções, como a posição ocupada pela figura masculina ou a luta por certos objetivos de vida. Em 2015, Rodrigo iniciou estudos de autorretratos por meio da fotografia. Surgiram as séries Clinch, nas quais o artista aparece em ação performática, como o boxeador que encara o espectador, o cenário das artes, a vida. Essa obra marca o momento em que Linhares declara se reconhecer como artista.

Tais processos convergem em Artista Sofre (2015). Reproduções fotográficas em preto e branco de autorretratos anteriores recebem inscrições e intervenções em cores, que potencializam a expressividade da fotografia. Há frases que escancaram questionamentos políticos, críticas ao posicionamento social do artista e demais integrantes do circuito cultural. Paralelamente a essa tomada de consciência do seu “ser artista”, Linhares começou a representar o ambiente de sua casa-ateliê-galeria em fotografias de grandes dimensões, como #6 República (2016). A casa mesclada ao ofício sugere um rebatimento entre público e privado. A afetividade é evidenciada por meio da intimidade ali revelada: a presença da gata de estimação ou de objetos de uso pessoal.

Esta mostra encerra-se com proposições resultantes da técnica do desenho lavado, desenvolvida entre 2018 e 2019. O impulso conceitual de dissecar o objeto de pesquisa poética deixa vestígios também nessas obras, que analisam profundamente o ato do desenho, enquanto veículo de expressão, e seus valores – a questão gráfica, o traço, a mancha. Linhares parte de fotografias e proporciona, por meio dessa solução plástica, um aumento no nível de ruído e provocação da obra. As oposições entre áreas de penumbra e de luz revelam o incômodo e a desorientação diante da dureza do contexto político-social. A sujidade das produções e a aparência de precariedade do material usado contribuem para a constituição da potencialidade do trabalho, que beira sensações violentas.

O amadurecimento permitiu a Linhares deixar, apenas recentemente, um processo de intensa aparição da própria imagem nas obras, para sua presença sintetizar-se na fusão com o mundo, seja o mundo humano, animal, científico ou das paixões. Nessa medida, suas obras ganham riqueza e complexidade, e atribuem maior vivacidade ao vetor “arte-sociedade-arte-vida (1) , que orienta a sua trajetória.

Adriana Dolci Palma
Curadora

(1) In: FREIRE (Org.). Hervé Fischer no MAC USP: arte sociológica e conexões: arte-sociedade-arte-vida. São Paulo: MAC USP, 2012, p. 13.

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GALERIA

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